02/06/2025 às 13:44 Além do clique

Escolhas: o que realmente importa em uma fotografia de futebol?

7
3min de leitura

Nosso dia a dia é moldado por escolhas. Desde a hora em que acordamos até o instante em que vamos dormir, estamos o tempo todo decidindo. Algumas são banais, quase automáticas. Outras, determinam rumos, constroem legados. Na fotografia, especialmente na cobertura de um jogo de futebol, não é diferente. A cada lance, a cada movimento, a cada clique, há uma escolha sendo feita — consciente ou não.

Escolhas. Quantidade ou qualidade? Um clique qualquer ou um clique representativo? Enviar fotos enquanto a bola ainda rola para mostrar eficiência e rapidez ou manter o foco absoluto no jogo, nos lances decisivos, na construção de uma narrativa visual que realmente conte a história da partida com peso, significado e relevância?

Essas são apenas algumas das decisões silenciosas que um fotógrafo esportivo enfrenta ao longo dos 90 minutos (e acréscimos) de uma partida. E, dentre elas, eu escolho — e sempre escolhi — as segundas opções. Prefiro qualidade à quantidade. Prefiro o clique com propósito ao clique por impulso. Prefiro acompanhar o jogo com atenção plena, como quem lê um livro e tenta absorver cada detalhe da narrativa, ao invés de tentar provar que consigo ser multitarefas enquanto o jogo ainda está em andamento.

Não existe certo ou errado. Existe apenas o que cada profissional acredita. E eu acredito na fotografia com alma. No clique pensado. No jornalismo visual com essência, que respeita a integridade da história e não se deixa moldar inteiramente pelas exigências de um tempo em que tudo precisa ser imediato, veloz, efêmero.

Sim, o mundo mudou. Está mais dinâmico, mais conectado, mais acelerado. Mas é preciso refletir: para onde essa pressa — disfarçada de eficiência e profissionalismo — está nos levando? O que ela está fazendo com a qualidade do jornalismo e, mais especificamente, com o fotojornalismo esportivo?

Se eu tivesse seguido essa lógica da velocidade a qualquer custo, talvez não tivesse feito aquele clique específico, emblemático: a mão na bola de Neymar, contra o Botafogo. Um detalhe que foi decisivo no resultado da partida. Mas eu estava ali, atento, acompanhando lance a lance, com a câmera em punho e o olhar treinado para encontrar não apenas uma imagem, mas a imagem. Não estava preocupado em provar que era ágil em enviar fotos durante o jogo. Eu estava concentrado em fazer o que acredito: capturar o instante exato, o momento que fala por si, que registra a história e que carrega o peso do que realmente importa.

É como diz o velho clichê do pato: ele anda, nada e voa — mas não faz nenhum dos três com excelência. Prefiro ser excelente no que me proponho a fazer, mesmo que isso vá contra o fluxo. Prefiro a imagem que permanece àquela que apenas passa.

E, para fechar, uma analogia que resume tudo: contextos diferentes, épocas distintas, competições opostas, mas com a mesma essência. O clique da mão na bola de Neymar pode não ter sido um gol, mas foi o momento decisivo do jogo. Um detalhe que fez diferença. Assim como a mítica “Mão de Deus”, de Maradona, na Copa do Mundo de 1986. Lá, o gol valeu. Não havia VAR. A imagem eternizou o momento. Aqui, com toda a tecnologia e cobertura disponível, ainda assim, o olhar atento e a escolha de contar bem a história fizeram a diferença.

No fim das contas, a fotografia é feita de escolhas. E são elas que moldam não só o nosso trabalho, mas também o legado que deixamos. Eu escolho contar histórias que ficam.





02 Jun 2025

Escolhas: o que realmente importa em uma fotografia de futebol?

Comentar
Facebook
WhatsApp
LinkedIn
Twitter
Copiar URL

Tags

Dennis Calçada Fotografia Fotografia de futebol Fotojornalismo Futebol Neymar Santos FC

Quem viu também curtiu

10 de Ago de 2024

Criando arte em preto e branco: A maestria do sistema de zonas de Ansel Adams

21 de Jan de 2024

A influência do design na composição fotográfica

09 de Jul de 2024

O uso do espaço negativo na composição fotográfica

Logo do Whatsapp